Reflexões em 11 de Setembro

Escrito por: 

Publicado em: 

sab, 15/09/2001

Prezados Amigos:

Como deve ter acontecido com muitos de vocês, eu tive dificuldade para dormir a noite passada, após os terríveis eventos acontecidos durante o dia. Eu vi as imagens do pesadelo da destruição em Nova Iorque e Washington, DC, repetidamente durante o dia na televisão, e novamente durante a noite, com os olhos de minha mente. Recebi muitos e-mails maravilhosos, repletos de empatia e apoio, de colegas preocupados, em muitas partes do mundo. Como escreveu um amigo do Reino Unido: "Eu não sei o que dizer. É um sonho horrível e eu ainda espero acordar. Tanta beleza e tanta feiura no mesmo mundo. Espero que a PNL possa fazer alguma diferença nisso que está se desenrolando."

Meus pensamentos, também, voltaram-se para o que esses eventos significam em relação à PNL e às pessoas que a praticam. Minha conclusão é que este é um momento de "despertar" para todos nós.

O dicionário define "despertar" como "sair do sono", "emergir de um estado de indiferença, letargia e dormência", ou "tornar-se plenamente consciente, alerta e atento". As ocasiões de crescimento e transformação em nossas vidas são geralmente acompanhadas por esses "despertares". É como se fôssemos despertados de um tipo de sono – sair de uma espécie de letargia autoimposta, - ou se estivéssemos cegos e de repente recuperássemos a visão. Nossos mapas mentais sobre quem somos e o que é possível no mundo tornam-se mais amplos, e percebemos as antigas limitações de uma maneira completamente nova. Nessas experiências, conseguimos abandonar nossos velhos padrões mentais e "sair da caixa."

Geralmente o despertar nos proporciona um sentimento renovado de finalidade e significação, uma expansão da consciência, uma percepção clara e uma revitalização física e emocional.

O despertar, muitas vezes, é associado à expansão cognitiva ou mental, mas também pode ser relacionado ao nosso coração e às nossas emoções. O despertar, frequentemente, tem a ver com a religação às nossas motivações, no nível mais profundo.

Embora o despertar geralmente seja bom, nem sempre é agradável. Parece-me que os eventos de 11 de setembro foram do tipo de um acordar desagradável.

Em nosso seminário, 'Love in the Face of Violence', Stephen Gilligan frequentemente citou o grande físico dinamarquês, Nils Bohr, que diz haver dois tipos de verdade: a verdade superficial e a verdade profunda. De acordo com Bohr, "Na verdade superficial, o oposto é falso. Na verdade profunda, o oposto também é verdadeiro." Beleza e feiura são verdades profundas. O fato de que há grande beleza e esperança no mundo não significa que ele também não seja feio. E o fato de as pessoas serem capazes de agir de maneira tão terrível não significa que também não sejam capazes de criar milagres.

Uma vez que alguém tenha sido despertado para a verdade mais profunda, ele é capaz de fazer escolhas reais. Se ambos são verdadeiros, onde escolherei colocar as energias de minha vida? Devoto-me à luz ou sucumbo à escuridão.

De fato, é importante apontar que, às vezes, "quanto mais intensa a luz, tanto mais escuras as sombras." Quando experimentei um despertar espiritual, mesmo que ínfimo, de repente eu vi sombras que não via antes porque a luz tornou-se mais brilhante.

Quando minha filha nasceu, por exemplo, tive uma das experiências mais maravilhosas de minha vida. Eu acho que ter uma filha transforma um homem. Quando Julia nasceu, abriram-se partes do meu coração que eu nem sequer sabia que estavam lá antes. Ela foi realmente uma luz brilhante, e eu me senti plenamente desperto na sua presença. Mas após passar mais ou menos um verão inteiro com ela, eu precisei viajar novamente. Voei para a Europa para realizar um seminário. Essa foi a primeira vez que fiquei muito longe dela. Uma manhã, eu estava no banheiro de meu hotel, preparando-me para ir ao seminário. A televisão estava ligada, e eu ouvi um choro na outra sala. Por um momento, pensei que fosse minha filha, chorando de dor ou de medo. Eu corri para a outra sala e descobri que o choro vinha da televisão. Era uma reportagem sobre o povo da Somália. Na tela estava uma menininha da Somália, morrendo de fome. O choro dela soou justamente como o de minha filha. Eu estava tão ligado à minha filha que foi como se meu coração estivesse sendo partido pela imagem da televisão. Antes do nascimento de Julia, eu teria simplesmente visto uma imagem anônima na televisão. Agora, o sofrimento de uma criança, a milhares de quilômetros de distância, estava cortando meu coração.

Eu compreendi, naquele momento, que tinha de fazer uma escolha: Eu poderia desligar e dizer: "Ah, isso é algo que está acontecendo muito longe de mim. Está acontecendo com alguém muito diferente de mim, a quem nem conheço e com quem não me preocupo." Ou, eu poderia manter meu coração aberto e compreender que o bebê não estava mais longe do que minha própria filha (tanto física como emocionalmente). O espectro do sofrimento e da morte tornou-se uma sombra muito real. O fato de que pessoas estivessem morrendo de forme não era mais algo que em que eu podia pensar como se fosse apenas um conceito. Eu estava sentindo isso. E decidir fechar meu coração significaria amar menos a minha própria filha. Eu compreendi que amar minha filha significava permitir que meu coração fosse partido. Era como se alguém que eu amasse estivesse morrendo e eu fosse incapaz de fazer algo sobre isso. Essa sombra estivera lá durante toda a minha vida, mas a escuridão e a realidade dela nunca tinham sido tão óbvias antes.

Esta é uma ilustração de como, quando a luz se torna mais forte, a Sombra se torna mais visível. Na presença da luz, não podemos mais ignorar a dor, o sofrimento e o medo.

Para mim, essa foi a decisão que tomei com respeito à criança com fome e à minha filha. Decidi ‘amar mesmo assim’, o que significava amar a menininha a quem vi morrendo na televisão, mesmo se eu não pudesse fazer algo sobre isso, e mesmo se o amor por ela me causasse um sofrimento maior.

Eu senti essa mesma dor muitas vezes ao ver as imagens na televisão ontem.

Foi minha própria filha, hoje com 10 anos de idade, que me perguntou repetidamente: "Por que alguém faria isso, papai? Eles não sabem que estão machucando e amedrontando as pessoas?"

No começo, eu respondi, "Sim, querida, eles quiseram machucar e assustar as pessoas."

"Mas", persistiu ela, "por quê? Por que querem machucar e assustar as pessoas, o que isso dá para eles?"

Em seu desejo inocente, mas determinado de compreender e mudar as coisas, ela estava procurando a causa raiz, a verdade mais profunda, a intenção dos criminosos. Esta procura de uma intenção positiva, especialmente quando as coisas são difíceis, parece ser parte de nossa tarefa como pessoas. Em "Tools of Spirit", Robert McDonald e eu mostramos que este é o princípio espiritual da PNL.

A pergunta de minha filha continuou ecoando enquanto eu via as comemorações das crianças no campo de refugiados da Palestina. "A América está morta. Deus está livre". O que adiantará a eles se a América estiver morta? O que adiantará a eles se Deus estiver livre? Estas são algumas das primeiras perguntas que devemos fazer, se quisermos encontrar outras escolhas e criar uma solução verdadeira e permanente.

Algumas vezes, ontem, eu me lembrei da história em que Albert Einstein foi abordado por um repórter durante uma entrevista, que lhe perguntou algo como: "Dr. Einstein, o senhor é reconhecido no mundo inteiro como um dos maiores gênios de boa fé de nosso século, talvez da história da humanidade. A abrangência de seu pensamento cobriu as obras universais, desde o minúsculo átomo até o cosmos. O senhor viu que suas descobertas fazem evoluir e enriquecer, e também mutilam e destroem a vida humana, que o senhor tanto valoriza. Qual é, na sua opinião, a pergunta mais importante para a humanidade, hoje?"

Ao seu jeito característico, Einstein mirou o espaço por um momento, e depois olhou para o chão à sua frente. Finalmente, ele olhou para o repórter e replicou: "Eu acho que a pergunta mais importante que hoje desafia a humanidade é: ‘O universo é um lugar amistoso?‘ Esta é a primeira e mais básica pergunta que todas as pessoas devem responder para si próprias."

"Porque se decidirmos que o universo é um lugar não amistoso, então vamos usar nossa tecnologia, nossas descobertas científicas e nossos recursos naturais para conseguir segurança e poder, criando muros mais altos para manter longe de nós o que não é bom e armas maiores para destruir tudo aquilo que não é amistoso – e eu acredito que nós estamos chegando a um ponto em que a tecnologia é suficientemente poderosa para que possamos isolar-nos completamente ou destruir a nós mesmos nesse processo."

"Se decidirmos que o universo não é amistoso nem inamistoso, e que Deus está essencialmente ‘jogando dados com o universo’, então somos apenas vítimas de dados jogados ao acaso e nossas vidas não têm finalidade ou significado real."

"Mas, se decidirmos que o universo é um lugar amistoso, então vamos usar nossa tecnologia, nossas descobertas científicas e nossos recursos naturais para criar ferramentas e modelos que nos levem a compreender o universo. Porque o poder e a segurança virão através da compreensão de suas obras e de seus motivos."

Eu mesmo não tenho qualquer resposta para as muitas perguntas que surgiram com os eventos de ontem, mas eu sei que devemos ser congruentes e despertos para encontrar as respostas através da compreensão. Ao considerar como lidar com as consequências da tragédia de ontem, lembrei-me do comentário de Gregory Bateson de que "O amor pode sobreviver somente se a sabedoria tiver uma voz efetiva." Eu também me lembrei de uma importante lição de vida que aprendi quando criança de meu pai: "dois erros não fazem um acerto". Como praticante da PNL, eu espero que os terríveis eventos de ontem despertem novamente em nós o compromisso de continuar a "criar um mundo ao qual as pessoas queiram pertencer", e que nos tornemos, nós mesmos, despertadores.

De muitas formas, líderes, orientadores, consultores, terapeutas e professores são despertadores; abrindo novas perspectivas e possibilidades para seus alunos, clientes e colaboradores. Acordar os outros envolve dar-lhes suporte para crescer no nível da visão, missão e espírito. Um despertador dá assistência a outras pessoas, oferecendo-lhes contextos e experiências que tragam à tona o melhor de sua compreensão e consciência de finalidade, de si próprias, e dos sistemas superiores aos quais elas pertencem.

Ser um despertador requer capacidades de orientador, professor, mentor e patrocinador em algum grau, mas tem outras dimensões. É óbvio que não é possível acordar os outros se você mesmo ainda estiver dormindo. Assim, a primeira tarefa de um despertador é acordar e permanecer acordado. Um despertador "acorda" os outros através de sua própria integridade e congruência. Um despertador coloca as outras pessoas em contato com sua própria missão e visão, estando em pleno contato com sua própria visão e missão.

A tarefa do despertador é colocar luz sobre as situações obscuras, e não lançar a sua própria sombra sobre a escuridão que já está lá. Os despertadores não têm ilusões sobre a natureza humana – assim, eles não têm surpresas negativas. Mas eles possuem uma crença muito forte sobre o que é possível.

Despertar os outros envolve a aceitação incondicional de quem e como eles são; e, ao mesmo tempo, a sugestão de que existem possibilidades e escolhas de expansão e evolução. O acordar pode ser gradual ou repentino (como um momento de "epifania" ou percepção imediata). O acordar frequentemente conduz ao aprendizado no nível daquilo que Gregory Bateson chamou de Aprendizado IV – a criação de algo "completamente novo."

Em PNL, a coisa mais próxima da oração que fazemos é "guardar a intenção". Parece-me ser apropriado, nesta hora, para todos nós da comunidade da PNL, guardar a intenção de curar, e curar pela sabedoria, as pessoas e suas famílias que foram devastadas por esta experiência, e a sabedoria de decidir como responder.

Para encerrar, lembro as palavras de Albert Einstein:

"Um ser humano é parte do todo a que chamamos de ‘universo’... uma parte limitada no tempo e no espaço. Ele experimenta seus pensamentos e sentimentos como algo separado de todo o resto – uma espécie de ilusão ótica de sua consciência. Essa ilusão é uma espécie de prisão para nós, restringindo-nos aos nossos desejos pessoais e à afeição por umas poucas pessoas que estão próximas de nós. Nossa tarefa deve ser libertar-nos dessa prisão, alargando nosso círculo de compaixão para abraçar todas as criaturas vivas e toda a natureza em sua beleza."

A todos, obrigado por seu interesse e desejos do melhor.

Robert Dilts
Santa Cruz, Califórnia - 12 de setembro de 2001

Trad. Hélia Cadore.

Artigo original: http://www.nlpu.com/Articles/Sept_11.html

Categoria: