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Anos atrás quando eu trabalhava como consultor, Eileen (nome fictício) veio me ver. Do ponto de vista dela, tudo na vida dela estava errado. Por exemplo, ela, como eu, veio morar na Grã-Bretanha vinda da Irlanda, e eu ainda me lembro do momento em que ela fez o comentário imortal: "É evidente que eu não preciso lhe contar a discriminação e o preconceito que eu tive que aguentar!"
Nessa época, eu já vivia na Grã-Bretanha há cerca de 20 anos, me socializando e trabalhando com os ingleses. De fato, quando cheguei aqui pela primeira vez, passei quase um ano trabalhando nos ônibus de Londres, encontrando centenas de pessoas todos os dias. E não tive, nem tenho desde então, sofrido preconceito de qualquer espécie por ser irlandês. Mas Eileen sim! De fato, de acordo com ela, ela sofre preconceito o tempo todo.
Como aconteceu isso?
Isso é mais ou menos como o fenômeno do carro novo. Durante anos você dirigiu, digamos um Ford Escort e agora comprou um Renault Clio. E de repente você descobre que quase todo mundo saiu de madrugada e comprou um Clio! Lógico que eles não o fizeram. Eles já estavam por aí dirigindo esse carro – apenas você não havia percebido. Mas como agora você está sintonizado no Clio, você enxerga um em tudo que é lugar.
Como aconteceu isso?
Aproximadamente vinte anos atrás, quando comprei o meu primeiro computador, eu fui procurar uma revista sobre computadores numa banca de jornal. Até aquele momento, eu nunca tinha visto uma e pensava que para conseguir uma teria que fazer um pedido especial. Mas, adivinhe? De repente surgiram prateleiras cheias de revistas relacionadas à computadores! Os editores haviam decidido publicar todas essas revistas só para mim!
Como aconteceu isso?
Depois, temos o fenômeno "um daqueles dias". O seu dia não começa muito bem; uma ou duas coisas saem erradas e você diz para si mesmo: "Ah não, vai ser um daqueles dias!" E, naturalmente, você está coberto de razão: você percebe que, de repente, o mundo conspirou para que hoje tudo fique difícil para você. Quando você está pronto para sair, não consegue encontrar as coisas que normalmente tem que levar. No seu caminho para o trabalho, tudo e todos o atrasam. Quando chega ao trabalho, o astral das pessoas mudou e elas estão irritadas, aborrecidas ou indiferentes. E assim vai o dia todo.
Como aconteceu isso?
Ou que tal: "Coisa ruim sempre acontece três vezes?" Alguma coisa ruim ocorre e você ignora. Outra acontece e você de repente se lembra da primeira. E você pensa consigo mesmo: "Lá vamos nós, coisa ruim sempre acontece em trios – qual será a próxima?" E, com certeza, em pouco tempo você terá provado que estava certo e alguma coisa mais vai dar errado. Elas sempre acontecem em trios, você sabe! Agora, como as suas expectativas foram satisfatoriamente cumpridas, você para de ficar de olho. E as coisas ruins param de acontecer.
Como aconteceu isso?
Você agora está percebendo o padrão? Nós nos colocamos acima das profecias autorrealizáveis. Nós selecionamos o nosso mito para o dia, ou pior, o nosso mito para a vida e, em seguida, saímos procurando evidência para apoiá-lo! E encontramos essa evidência por tudo que é lugar, em abundância.
Se o meu mito para a vida é que as pessoas não gostam de mim, eu vou encontrar muitas evidências que confirmam isso.
Se o meu mito para a vida é que as pessoas "de cor violeta" (ou qualquer grupo alvo que eu selecionar) são indignas de confiança, preguiçosas, violentas ou qualquer coisa, eu vou encontrar muitas evidências que apoiem isso.
Outros mitos da vida... Existem muitos estrangeiros no meu país. Os jovens de hoje não obedecem às leis e estão fora de controle. O mundo é um lugar perigoso e violento. A minha cidade é um lugar perigoso. Os velhos são uns chatos. Os desempregados e os sem-teto são parasitas. E isso segue sem parar – motoristas mulheres, motoristas homens, donos de cachorros, esqueitistas, motoqueiros, católicos, muçulmanos, hindus, judeus, etc., etc.
Depois existem os mitos sobre o próprio indivíduo. Eu sou um inútil. Eu estou perdendo a memória. Ninguém gosta de mim. Eu não sou de confiança. Eu não sou bom em matemática. Eu sou muito alto, baixo, gordo, muito magro, feio, etc.
E os mitos sobre o(a) companheiro(a)? Ela não é mais engraçada como antes. Ele está perdendo sua boa aparência. Acho que ela está tendo um caso. Ele não me ama mais como costumava fazer.
Qualquer que seja o seu mito favorito (ou preconceito)
Você vai encontrar muitas evidências que o apoiem. É um pouco como ter um filtro no seu cérebro que deixa entrar a evidência que apoia o seu preconceito e repele qualquer evidência que pode contestá-lo. E, como você está inconscientemente criando aquele argumento poderoso para apoiar o seu preconceito, também muda o seu comportamento em relação ao assunto - o que cria mais e mais forte evidência.
Ele/ela está tendo um caso!
Vamos pegar o mito - eles estão tendo um caso. Você percebeu que ultimamente a sua companheira parece mais feliz. Fica um pouco mais de tempo fora de casa. Cuida um pouco mais da sua aparência, etc. Então você "sabe" que ela está tendo um caso. Por causa disso, você se torna agressivo ou introvertido. Você a questiona mais, procura evidência física, pega em cada comentário dela, etc.
O seu comportamento agora (como ele é experimentado por eles) mudou e eles começam a reagir a esse novo comportamento. Eles estão descobrindo que você não é mais tão divertido para ficar por perto – por isso ficam mais tempo fora. Mais evidência para você! Eles acham o seu questionamento irritante e intrusivo e o experimentam como uma prova da sua falta de confiança neles – por isso se tornam menos sinceros e afáveis. E dessa forma as coisas se agravam - por vezes muito rapidamente.
Prejulgar é mais fácil do que pensar!
Preconceito ou "prejulgar" é um fenômeno interessante... é o processo de ter opiniões já prontas. O bom é que ele nos poupa ter que pensar. Nós não precisamos - nós já temos pronto o nosso prejulgamento! Eu não preciso conhecê-lo melhor - posso dizer que tipo de pessoa você é pelo seu porte, ou pela sua cor da pele, ou pelo seu sotaque, ou sua religião, ou suas posses, etc.
Como isso acontece?
Nós normalmente não "escolhemos" ser preconceituosos. Às vezes, desenvolvemos os nossos preconceitos por descuido. Inconscientemente assumimos a opinião pré-digerida dos outros - a opinião do jornal que lemos, ou dos produtores de TV ou do programa do rádio que estamos ouvindo, ou mesmo dos nossos colegas de trabalho, ou dos amigos ou familiares (especialmente quando éramos muito jovens).
Todos os nossos preconceitos são mantidos através da nossa própria negligência mental: por não nos preocuparmos em pensar criticamente e, por não admitirmos como o nosso estado de ânimo desvirtua as nossas percepções e como isso começa o processo para acumular dados a favor e a ignorar as evidências contrárias.
Digamos, por exemplo, que eu esteja irritado e frustrado com certas coisas em casa ou no trabalho. E não queira ou tenha medo de confrontar ou perturbar as pessoas que lá estão.
Agora, quando não estou lá, fazendo compras ou me socializando, pequenas coisas que normalmente eu ignoro, agora me chateiam e eu, interiormente, responsabilizo as pessoas envolvidas - eu descobri um alvo para os meus sentimentos. De agora em diante, vou estar à espera de um comportamento semelhante dessas pessoas para 'provar' meu novo preconceito. E, ao evitar o pensamento crítico, posso ignorar qualquer evidência, desconfortável ou conflitante.
O metamodelo e as generalizações
No metamodelo da PNL, o fenômeno dessa profecia autorrealizável é reconhecido no padrão das generalizações, que mapeia como nós criamos inconscientemente uma crença global baseada em poucos exemplos isolados e depois mantemos essa crença, não prestando atenção para as exceções da regra que acabamos de criar.
As implicações
E daí? Eu tenho preconceitos. Você tem preconceitos. Todos nós temos preconceitos. Será que isso realmente importa?
Isso depende em grande parte se os seus preconceitos são sérios ou são questões triviais. A profecia autorrealizável ‘um daqueles dias’ pode não ser uma particularmente séria. Por outro lado, ter um preconceito sobre um grupo particular, ou raça, religião, é uma questão completamente diferente. E desenvolver um preconceito sobre alguém íntimo seu, pode estragar rapidamente a relação.
A solução?
Use pensamento crítico e auto-observação. Sempre que você se encontrar arranjando evidências contra uma pessoa ou um grupo, desafie a você mesmo com perguntas como:
"Isso é verdade em cada momento?"
"Será que todas as pessoas desse tipo se comportam exatamente como essa?"
"Existem exceções a essa regra?"
"Estou, nesse momento, simplesmente filtrando e criando uma profecia autorrealizável?"
O fenômeno criação de preconceito é um exemplo de como formamos as nossas crenças. Em um extremo, as pessoas morrem pelas suas crenças - sem sequer pensar - e há ampla evidência disso no mundo de hoje.
Menos extremo, é a multiplicidade de pequenos preconceitos que corroem a nossa felicidade, a paz de espírito e os relacionamentos. Não é necessário erradicar todos eles, imediatamente. Comece desafiando os seus e, aos poucos, eles irão se dissolvendo.
Reg Connolly é Trainer e Master Practitioner de PNL, treinador de administração e de vendas.
O artigo original "Prejudice: Seek and you will find!" encontra-se no site The Pegasus NLP Training
Tradução JVF, direitos da tradução reservados.