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Uma vez, na primeira manhã de um workshop, conheci uma senhora muito angustiada. Antes do workshop, ela tinha ido ver o seu médico, e eu imagino que ela deveria estar muito mais angustiada ao vê-lo do que quando eu a vi.
"Estou me sentindo muito desequilibrada,” disse ao médico. "Eu me sinto como se estivesse prestes a sofrer uma queda.” Ela explicou que é como se tivesse andado numa corda bamba toda a sua vida, e que achava a sua vida muito difícil. “Eu tento não colocar o pé errado”, disse ela, "sempre piso com muito cuidado.” O médico viu a sua aflição, ouviu o modo com que falava aquelas palavras, e sugeriu que ela estava deprimida e ofereceu uma receita de antidepressivo e uma indicação para um terapeuta cognitivo comportamental. Aí sim, ela teve uma razão a mais para ficar angustiada!
Normalmente, quando um cliente se comunica por uma metáfora como essa, ele está apenas parcialmente ciente disso, a comunicação é completamente ignorada, e o ouvinte cria conclusões ilógicas, em vez de realmente ouvir o que o cliente está dizendo. Eu chamo isso de surdez cognitiva.
A pessoa fala, nós ouvimos o barulho que o seu sistema vocal faz, e ignoramos completamente o que ela realmente disse. "Eu sei o que você quer dizer," dizemos a fim de manter a ilusão de que a compreendemos. Apesar do cliente ser totalmente explícito sobre a sua experiência, isso normalmente é ignorado. Surdez cognitiva. Mas e se nós reagimos diretamente à comunicação metafórica?
Uma maneira de se fazer isso é elaborar um desenho do que o cliente disse e mostrar a ele. Ela disse que estava se sentindo “muito desequilibrada, caminhava para uma queda, andava em uma corda bamba tentando não colocar o pé errado, pisava com cuidado.” Então eu faço um desenho de alguém balançando em uma corda bamba, alta do chão. Eu mostro a ela e pergunto: “É assim?" É grande a chance dela dizer sim. O cliente comenta sobre a minha capacidade artística e de ter prestado atenção no que ele falou, e/ou me diz que eu entendi tudo errado e se oferece para fazer correções. “A corda está muito mais longe do chão, e como o chão é todo de pedras irregulares: se eu cair da corda, eu fico gravemente ferido." Dessa forma, nós dois descobrimos se eu o ouvi com precisão ou não.
"Deprimido" é uma substantivação muito geral, aplicada a tantas pessoas por muitas razões diferentes, por isso nos diz muito pouco. Ao discutir a metáfora dela, muitas coisas ficaram claras. Ela tinha um caminho fixo na vida, que não se adequava a ela. Ela não gostava de representar o número da corda bamba nas alturas, e nunca se sentiu realmente ligada ou no chão, apesar das suas melhores intenções. A sua corda bamba lhe dava uma posição elevada, mas ela tinha que andar continuamente com muito cuidado, pois podia colocar o pé errado. Havia muita tensão e ela tentava viver com grandes expectativas. Isso a isolava dos outros. Ela andava sozinha nessa tênue linha. O número da corda bamba ao ser no alto obrigava os outros a olharem para cima, o que dava a impressão dela estar olhando para baixo afim de enxergar as outras pessoas. Naturalmente que ela não se sentia assim, ela só se sentia miserável. Os antidepressivos não mudariam nada disso. Na verdade, poderiam até ajudá-la a manter um pouco mais esse ato miserável.
Anos atrás, um cliente viria me ver e me diria algo como: "Eu me sinto como se estivesse no fim das minhas forças. Não posso esperar mais, preciso de ajuda". Meu cérebro iria dizer: "Nossa! Isso soa mal! Deprimido, pensamentos suicidas?" e como um terapeuta decente, eu acreditava que devia investigar a concepção suicida, as crenças negativas, o afeto emocional perturbado e assim por diante. Com certeza, eu acharia que ele recorreu ao seu clínico geral para uma avaliação médica e eu poderia ficar preocupado a noite toda pensando que ele poderia se matar depois da nossa sessão.
Não há nada errado em qualquer uma dessas coisas, é claro, é uma prática bastante normal, mas aqui está o ponto: não foi isso o que ele disse. Nada disso. Tudo isso foi o que eu inferi do que ele quis dizer; foi todo o conteúdo que eu impus a ele. Expressões metafóricas são muitas vezes desprezadas - mesmo por nós - como "apenas figuras de linguagem que não significam nada”.
É essa lamentável combinação de circunstâncias que eu procurei abordar com o meu trabalho sobre as Metáforas do Movimento. Ao ouvir atentamente as metáforas de um cliente, podemos começar a ouvir coisas de dentro da experiência do cliente das quais ele próprio usualmente está totalmente inconsciente do que está comunicando. Como resultado, podemos entrar dentro da estrutura do problema muito rapidamente, e para muitos clientes, isso pode parecer leitura mental, porque eu posso contar a eles coisas das quais estavam parcialmente cientes.
O que esse cliente realmente disse foi: "Eu sinto como se estivesse no fim da minha corda, não posso esperar mais, preciso de ajuda." Mas eu não o ouvi dizer isso, porque eu estava muito ocupado enchendo as lacunas com o que eu entendi que as coisas seriam, e não como ele comunicou que eram. Eu teria perdido o fato de que ele estava se comunicando por metáfora e como resultado, sem perceber, eu teria ignorado essa metáfora.
Então, de qualquer maneira, o que é exatamente uma corda bamba? Eu procurei na internet. "A corda bamba é uma corda, um instrumento ou um sinal que ancora algo móvel a um ponto de referência que pode ser fixo ou em movimento." Então, isso é muito claro. A outra parte, porém, é um pouco ambígua: "Eu não aguento mais." "Aguentar" pode significar esperar, ou pode ser que ele esteja metaforicamente segurando a corda bamba metafórica como um homem pode aguentar uma corda.
Eu consigo duas imagens principais disso: 1. Amarrado como uma vaca impaciente no campo ou, possivelmente 2. Um homem suspenso no ar pendurado numa corda que está amarrada acima dele. Existem outras variações possíveis, mas você entendeu a ideia.
Então, vamos ouvir de novo o que ele disse, e apenas fazer inferências lógicas que combinam com a metáfora.
- É claro que o homem não está solto. Ele está amarrado.
- Ele provavelmente não está fazendo muito progresso. Ele não está chegando a lugar nenhum. Talvez ele esteja andando em círculos.
- Ele está amarrado e incapaz de escapar da situação.
- Ele esteve pendurado por muito tempo e precisa de ajuda.
- Ele está no fim da corda.
Em seguida eu posso devolver essas inferências para o cliente, a fim de reagir diretamente à sua comunicação metafórica, e também para verificar qual delas combina com a sua experiência. Se elas não combinarem, pelo menos, elas demonstram que a sua breve história foi ouvida com precisão, mesmo que ainda não tenha sido compreendido corretamente e dá as oportunidades do cliente para corrigir o meu entendimento.
Acontece que a experiência dele é como uma vaca no campo, ao invés de um homem pendurado em uma corda. Então eu fiz algumas perguntas muito direcionadas: "O que está à esquerda da corda? O que está à direita? O que está na frente?" E assim por diante. Juntos descobrimos um contexto mais amplo em torno da corda bamba, que funciona como um ponto de referência. Acontece que ele está realmente amarrado como uma vaca no campo e tem sido assim por algum tempo. "Eu só preciso me libertar dessa vida", lamenta. Aí eu poderia oferecer: "Então, você sente que está sendo explorado por tudo que você vale?" Isso se encaixa à metáfora e começa a sugerir questões de identidade." Você é tratado como gado, abandonado para ruminar as coisas . Você passa muito tempo ruminando?"
Isso é muito diferente do que sugerir a ele de que pode ser um suicida. Essa é a comunicação que realmente conecta com a experiência dele. Mais importante, é a comunicação que conecta com o que ele nos disse. Essa conexão foi encontrada pela investigação como sendo um fator importante em produzir mudança.
Metáforas de Movimento é sobre associar o seu cliente dentro da experiência dele, ajudando-o a descobri-la e a esclarecê-la, e oferecendo a ele possibilidades de mudá-la.
O artigo Hearing what other people are really saying encontra-se no site NLP Comprehensive.